Estrepolias esportivo-culinárias

Conheci Henrique, jovem e simpático patisseur paulista, durante evento na Firjan, onde a maior estrela era minha sogra, Laura Góes, por suas toneladas de atributos culinários exibidos na Pousada Alcobaça. Magro e franzino, o que mais me chamou a atenção em Henrique foi sua modéstia. Algumas vezes ele quase se desculpou por nunca ter ido à França, capital mundial da patisserie, como se se esquivasse de admitir o próprio talento.

A primeira vez em que fui ao Café Lilian, no CCBB, onde ele trabalha, fui invadida por sensações gastronômicas que raras vezes senti. Começou pelo couvert, com manteiga com flor de sal e pasta de grão de bico que ganhavam nobreza no pão caseiro quentinho. De suspirar.

Apesar de a casa oferecer um pacote que inclui entrada, prato principal e sobremesa, optei pelas duas últimas etapas. O polvo veio com um molho em que cada garfada me conduzia ao céu. Na falta de arroz ou batata para  absorver aquela maravilha, pedi mais uma poção de pão. E me senti no melhor dos restaurantes de nouvelle cuisine franceses: pouco volume e abundante sabor.

Nada, porém, foi capaz de superar a sobremesa criada por Henrique: o bolo denso de cacau com chantilly de passoca é uma invenção diabólica. Não seria exagero definir como a melhor que já comi. E tudo na elegância daquele cenário neoclássico, inaugurado em 1906, como sede da Associação Comercial do Rio de Janeiro e do Banco do Brasil. Serviço impecável. O alto padrão se manteve na segunda visita.

Infelizmente, escolhi o dia em que a torcida do Flamengo voltou do Peru com a taça Libertadores da América. Aquela multidão espremida nas avenidas do Centro não podia acabar bem. Homens urinando pelos cantos, pontos de ônibus depredados, agressividade contida por bombas de gás lacrimogênio. A sorte é que as armas ainda não estão liberadas, como propõe nosso presidente de extrema direita. Seria um morticídio.

A bagunça generalizada poderia ter se limitado ao lado de fora. Infelizmente não foi assim. Sempre com três alternativas, o cardápio só oferecia duas opções de carne vermelha – que abandonei em 1980 -  e uma vegana, que pedi. Era especial, contudo, não chegava aos pés dos pescados escolhidos anteriormente. Meu marido solicitou a mesma sobremesa que eu e vieram para ele morangos cozidos. Meu bolo já não tinha aquela magnífica consistência de desmanchar na boca. E o serviço deixou a desejar. Será que a equipe é contra o Flamengo?

No metrô, a violência latejava, hordas ameaçando pular as roletas. Positivamente, não foi uma boa ideia voltar ao Café Lilian nesse dia. Torço, todavia, para que a próxima vez não seja a última.