Papel ou digital?


“Essa gente” é o melhor romance de Chico Buarque. Em “Prólogo, ato, epílogo”, Marta Góes ajuda Fernanda Montenegro a imprimir realismo à sua própria história. “Escravidão”, primeiro volume da série de Laurentino Gomes é um imperdível capítulo de nossa maior tragédia. Devo essa agilidade de leitura, em tão curto espaço de tempo, ao presente que ganhei em 2018 das minhas filhas, sempre empenhadas em acertar na mosca: um e-book.
Nunca pensei que trocaria o prazer de folear as páginas de papel por uma geringonça onde cabe qualquer coisa, da melhor à pior literatura. Resolvi, porém, experimentar. Não custei a descobrir a facilidade de ler livros imensos, antes insuportáveis cargas que levava para todo lado nos transportes públicos. Tamanho, nesse caso, era documento. Costumava optar por exemplares menores para poupar a coluna. Comecei logo pela tora de mais de mil páginas, “Os pilares da terra”, magnífica obra de Ken Follet que traz à tona os primórdios da Idade Média. A segunda satisfação veio em seguida. Quando terminei, leitora voraz que sou, não precisei me dirigir a uma livraria para comprar o próximo. Fiz a aquisição na hora. E assim tem sido, um atrás do outro.
Essa, acredito, não é o tipo da propaganda ideal para os donos de livraria e para um escritor – além de jornalista, estou no meu quarto livro. Pelo simples motivo de que os livros eletrônicos são mais baratos. Por outro lado, ampliam o alcance. Por mais que as pessoas já prefiram comprar seus livros pelo e-commerce, entre a aquisição e o recebimento decorrerá um tempo maior do que se fosse no digital. Que traz ainda as vantagens de adequar o tamanho da letra ao gosto do freguês e possuir, literalmente, luz própria.
Quando lancei meu primeiro livro, “Ilha da Trindade, veo de mysterio à flôr dagua” (Editora Andaluz), em 2010, essa possibilidade sequer era cogitada. O mesmo aconteceu com o segundo, “Procura-se um milagre” (Nova Era), em 2011. O terceiro, “O útil ao agradável” (Chiado), em 2017, ganhou também a versão digital e o último, “A colcha escarlate” (Autografia), com lançamento marcado para 9 de dezembro, na Blooks de Botafogo, por enquanto também se limita ao papel.
Antes que alguém me crucifique por autopromoção, volto ao elogio de “Essa gente”. Os personagens entram em cena ao narrar, em primeira pessoa, a que vieram. A trama se constrói de uma forma original, sem aquelas apresentações prévias que facilitam a leitura e, dependendo do estilo, a empobrecem pela obviedade. E como estou às vésperas de fazer longas viagens de ida e volta de ônibus do Rio a Ubatuba, retornei às extensas e fascinantes narrativas de Follet, em “O voo da vespa”.  

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