Duelo entre ficção e realidade
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Albert Camus (1913-1960) |
A ficção aborda cenários macabros ocorridos durante as
pandemias que se abateram sobre o planeta no passado e deixaram profundas
marcas sobre a humanidade. Tal qual deve ocorrer agora, com efeitos ainda desconhecidos e impossíveis de ser previstos. Algo semelhante se deu
em 1947, com o impactante “A Peste”, de Albert Camus, onde Oran, na Argélia,
permanece fechada por meses enquanto uma doença dizima seu povo, como de fato
aconteceu na vida real. Os paralelos com nossa atual situação são constantes. No início, líderes
locais relutam em reconhecer os sinais precoces que vêm dos ratos morrendo pela
doença. "Os pais de nossa cidade estão cientes de que os corpos em
decomposição desses roedores constituem um grave perigo para a
população?", pergunta o colunista de um jornal.
A
gripe espanhola, por sua vez, que exterminou cerca de 50 milhões de pessoas em
1918, após os 10 milhões de mortos na Primeira Guerra Mundial, foi a fonte de
inspiração de Katherine Anne Porter para seu romance “Cavalo pálido, pálido
cavaleiro”, de 1939. "É terrível... Todos os teatros e quase todas as
lojas e restaurantes estão fechados, e as ruas estão cheias de funerais o dia
todo e ambulâncias ...”, diz um trecho, quase uma descrição fiel deste início de 2020.
Tão
ou mais assustador e atual é acompanhar a descrição que Ken Follet faz da arrogante juventude
nazista que começa a florescer antes da Segunda Guerra Mundial em “O inverno do
mundo”. "Ouviu mais uma vez o som rascante da voz cheia de ódio quando, em seu discurso no Parlamento, o líder alemão havia desprezado a democracia. Estremeceu com a lembrança dos focinhos sujos de sangue dos pastores-alemães que haviam dilacerado Jörg com a cabeça enfiada num balde". A cena nazista lembra os bolsomínions e seu líder, menos violentos, porém. Assim como no Brasil de hoje, eles demoraram, ou talvez nem se deram conta, do monstro que os inspirava...E agora, a realidade vai superar a ficção ou a ficção vai superar a realidade?
O que nos resta é manter a lucidez, a memória e elaboramos na análise dos fatos saídas menos sofridas e mais inspiradoras. O que temos é trabalho árduo pela frente.
ResponderExcluirBRAVO!!! belo texto.
Que fôlego! Definitivo!!!
ResponderExcluirWOW! Pequena-grande aula de História e Literatura no seu texto. Sou uma Ken Folletiana e ler essa cena do volume 2 me causou raiva e asco. São os mesmos sentimentos diante dessa ficção-realidade......
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