Oportunismo da tragédia

O professor João Cezar, da Uerj

Se você se escandalizou com a fatídica reunião ministerial de 22 de abril não se engane: foi muito pior do que parece. Ela sintetiza o que o professor de Literatura da Uerj, João Cezar de Castro Rocha, classifica como ‘ideário do bolsonarismo’ - sim, ele existe! -, ou seja, a arquitetura de destruição das instituições legadas pela constituição cidadã de 1988. Estudioso do tema, Rocha esquadrinhou o funcionamento dessa estrutura perversa, baseada no tripé ‘Visão de mundo bélica’, ‘Delírio do perigo vermelho’ e ‘Retórica do ódio’, a voz da extrema direita de Olavo de Carvalho.

O sistemático ataque à Cultura, ao Meio Ambiente e à Educação, portanto, se explicam e estão inseridas nesse contexto, que começa pela adoção da Doutrina da Segurança Nacional, criada nos EUA durante a guerra fria, período em que o capitão se formava na Academia das Agulhas Negras. Ela criava um mundo bipolar, dividido entre capitalistas e comunistas, perigo vermelho que precisava ser identificado e eliminado. Nesse contexto entra o "Orvil (livro ao contrário), tentativas de tomar o poder”, documento secreto de 953 redigido pelos militares em reação ao livro “Brasil nunca mais”, que identificou a tortura e os assassinatos como política de estado da ditadura. O Orvil, por sua vez, dava nome e sobrenome aos movimentos armados da esquerda.

Conforme o professor, o Orvil antecipou ainda o chamado marxismo cultural, quando, em  1974, a esquerda desiste da luta armada e assume sua mais 'perigosa' tentativa de poder. “Não mais com armas, mas seduzindo corações e mentes e se dedicando aos livros e ao aparelhamento de instituições ligadas às áreas da Cultura, do entretenimento, da Educação Pública, da imprensa e sobretudo das universidades e sindicatos”, afirma Rocha. Segundo ele, na página 222 do Orvil é citado Herbert Marcuse, para os militares, responsável pela destruição da cultura greco-romana cristã e de sua célula mater: a família nuclear burguesa, “o que nunca existiu naquela cultura”, ironiza o professor.

Para Rocha, nunca houve um governo tão eficiente nessa tarefa destrutiva como o de Jair Bolsonaro,  “mais perigoso do que a ditadura militar”. Investindo na tarefa de despertar a sociedade brasileira do pesadelo em que ela se encontra, o professor chama a gestão Bolsonaro de “oportunismo de tragédia”. Só se espera que, assim como a pandemia, esse pandemônio acabe, antes da terra arrasada. (Fonte: Meio, de Pedro Dória).

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