Passo a passo de uma emocionante descoberta

 


O forte do neurocientista Miguel Nicolelis é a ciência. No entanto, ele deu um show de estilo literário ao inaugurar sua coluna no jornal El País. Começa lembrando a simplicidade com que Einstein chegou à Teoria da Relatividade. Completou com a observação de seu “inesquecível” orientador, César Timo-Iaria, de que o gênio só deixara de fora de sua fabulosa equação a perda da noção de tempo. “Ele queria dizer que sem mergulhar nas abstrações mentais, sem hesitação ou temor, fica difícil fazer ciência de verdade”.

Isto posto, preparou para o por vir. Citou a coordenação que assumiu do Comitê Científico de Combate ao Coronavírus, no qual, passou a “navegar nas águas revoltas deste novo tempo analógico, durante boa parte de meus dias e noites”. Mencionou a experiência adquirida para assumir o cargo, quando estudou a epidemiologia das infecções hospitalares por bactérias resistentes a antibióticos, no início da carreira. Sua missão passou a ser, então, identificar as fragilidades no inimigo, o SARS-CoV-2, causador da Covid-19.

Começa então a analisar “o espalhamento” da doença pelas estradas federais brasileiras, e daí, para o interior. Noites a fio acompanhando estatísticas, gráficos e dados. Até que fez uma pausa, para interpretar por que a doença, "teimosamente" evitara penetrar no oeste do Paraná, no Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e nos sertões nordestinos. Até que “um simples mapa capturou minhas retinas cansadas”.

Suspense. “Bastou um olhar! Na minha frente, de repente, estava exposta a resposta que eu buscava há seis meses”, algo que comparou ao chute inicial de uma Copa do Mundo. Lamenta a falta do pai, da mãe e do escambau para comemorar a descoberta do seu ‘ovo de Colombo’.

Não. Não era a teoria da relatividade. “Descobri que o mapa do Brasil, com a distribuição de casos de dengue em 2020, era complementar ao mapa dos casos de Covid-19.” Assim, conseguiu ver que nos estados onde a dengue campeou nos últimos 18 meses a incidência de óbitos por Covid fora bem menor. Conforme sua hipótese, os mais de 3,5 milhões de casos de dengue registrados no Brasil em 2019-2020 “criaram uma espécie de paredão de proteção contra o coronavírus”.

Novos estudos poderão comprovar a tese de que uma vacina contra a dengue, já existente, poderia conferir uma imunidade cruzada ao SARS-CoV-2. Ciência em estado puro. Bingo!     

Comentários

Postar um comentário

Postagens mais visitadas deste blog

Starlink dança e Musk surta

Tudo muito inverossímil

Pela Internacional Democrática