Tiro pode sair pela culatra

 

Se você é daqueles que tenta combater disseminadores de fake news com a verdade, saiba que pode estimular ainda mais esses fanáticos. A tese foi levantada pelo blogueiro Davi de Carvalho, da Unicamp, e tem nome: efeito backfire.

O ‘tiro pela culatra’, em tradução livre, resulta dessas novas formas de exercer a política via redes sociais, mais amplamente dominadas pela direita e pela extrema-direita.

Ao contrário do que possa parecer à primeira vista, não tem nada a ver com burrice ou ignorância, e sim com raciocínio motivado, outra peça que surge nesses novos tabuleiros.

Corresponde a uma forma de pensar integrada por elementos que nos agradam, o que nos leva a chegar às mesmas conclusões a que já havíamos chegado antes.

Um exemplo do efeito backfire na politização que envolveu a pandemia está em minimizar a crise sanitária e compará-la a uma ‘gripezinha’, como fizeram os presidentes dos EUA, Donald Trump, e do Brasil, Jair Bolsonaro.

Seguidores dos presidentes passaram a replicar a mesma tese e a intensificar seu negacionismo com teorias conspiratórias, o que, por sua vez, turbina o raciocínio motivado.

Em 2015, os pesquisadores Brendamn Nyhan e Jason Reifler conduziram estudos sobre mitos relacionados a vacinas. Constaram que 43% dos americanos acreditavam que a vacina da gripe os levaria a contrair gripe. Conseguiram reverter a crença, porém, mostrando que aquilo era falso.

Entre os voluntários desconfiados de que a vacina poderia causar autismo, houve maior hesitação em vacinar seus filhos. O cientista político David Redlawsk sugere que se isolem os fanáticos para reduzir sua influência sobre os demais. 

Já estudos dos cientistas Thomas Wood e Ethan Porter levam a crer ser possível mudar a opinião de pessoas equivocadas e combater as fake news com a exposição de fatos cotidianos.   

O fato é que “vivemos tempos frutíferos de posturas anticientíficas e relativização da verdade, impulsionadas por líderes políticos e milhões de seguidores”, aponta Carvalho.

“Por isso é importante continuarmos a disputar, senão os corações, ao menos as mentes das pessoas e ter consciência de que o efeito backfire pode ocorrer”, conclui. Ou seja, todo cuidado é pouco nessa hora!