A voz do novo cidadão médio

 

O absurdo episódio de um preso domiciliar, como Roberto Jefferson, que xinga uma ministra do Supremo de “prostituta arrombada” pelas redes sociais, quando não deveria ter acesso a elas, e reage à ordem de prisão a tiros de fuzil e granada, ilustra bem a tese do cientista político Ivan Lago.

“Estou convencido de que Bolsonaro é uma expressão fiel do brasileiro médio, retrato do modo de pensar o mundo, a sociedade e a política do típico cidadão do nosso país.”

Esse brasileiro médio está longe da imagem romantizada do brasileiro receptivo, solidário, criativo e malandro. “Refiro-me à sua versão mais obscura e, infelizmente, mais realista.”

No mundo real “o brasileiro é preconceituoso, violento, analfabeto (nas letras, na política, na ciência... em quase tudo). É racista, machista, autoritário, interesseiro, moralista, cínico, fofoqueiro, desonesto.”

Apesar de o machismo ter se tornado crime, “ele sobrevive no imaginário da população, no cotidiano da vida privada, nas relações afetivas e nos ambientes de trabalho, nas redes sociais, nos grupos de whatsapp, nas piadas diárias, nos comentários entre os amigos “de confiança”, nos pequenos grupos que não irão denunciá-lo.”

É igual em relação ao racismo, ao preconceito em relação aos pobres, aos nordestinos, aos homossexuais. “Mas, como sempre ocorre quando um sentimento humano é reprimido, ele é armazenado de algum modo. Ele se acumula, infla e, um dia, encontrará um modo de extravasar.”

Foi algo que Lago viu acontecer em suas pesquisas com o “brasileiro médio”, “com os preconceitos reprimidos e escondidos, que viu em um candidato à Presidência da República essa possibilidade de extravasamento.”

Agora esse “cidadão comum” tem voz. Ele se sente representado pelo Presidente que ofende as mulheres, os homossexuais, os índios, os nordestinos. “Tem a sensação de poder ao ver o líder máximo da Nação usar palavreado vulgar e ofender quem pensa diferente.”

Foi o que se viu com o bolsonarista Roberto Jefferson. Que tentou matar agentes da PF quando não deveria ter armas, pediu ao Presidente (que disse não ter fotos com o criminoso), e foi atendido, a presença do Ministro da Justiça.

É essa a criatura que muitos brasileiros querem reeleger...