Como se amanhã não houvesse

Poderia lembrar aquela brincadeira de achar os ovos escondidos pelo coelhinho da Páscoa, não fosse pela monumentalidade das obras. Nos mesmos jardins onde passeava, pensativo, Getúlio Vargas, braços entrelaçados às costas, realçando a barriga proeminente, foram distribuídas ao ar livre 40 obras de artistas moradores do Catete e bairros adjacentes, “um estímulo ao pensar, agir e desejar em 360 graus”, conforme define a curadora, Martha Niklaus.
A mostra Grau 360 é uma das iniciativas do grupo Preserva Catete, que nasceu de um mal que veio para o bem. O grupo se uniu a partir das constantes enchentes do bairro a cada chuva mais forte, e deu uma lufada de oxigênio na área externa do vetusto Museu da República, onde o mesmo Getúlio se suicidou, em agosto de 1954.
As centenárias palmeiras imperiais foram envolvidas por faixas de papel com dizeres inspiradores, a exemplo do “Berçário de contemplação”, da foto abaixo. Um gigantesco vestido branco, com as extremidades borradas de vermelho, se move ao sabor do vento, enquanto pende uma rede verde, também pendurada no alto das árvores, com mais dificuldade de se movimentar por conta da mega bola alojada em seu interior. Mesmo assim, tem seus momentos de pêndulo. Um enorme rosto de mulher, estampado em pano branco, igualmente amarrado a uma árvore de cada lado, dança conforme a música do vento.
 Os dizeres “Não sou eu quem vai salvar o mundo”, composto por bolinhas verdes que flutuam no lago ganham ainda mais leveza – e significado - sob a luz suave do final de tarde. Cinco pequenas boias vermelhas onde se lê “Divisas Vis” formam um caminho imaginário no lago. O que parece ser uma estante de livros, sustenta tijolos.Tudo muito instigante.
 Cartazes nas duas extremidades dos jardins explicam ao que veio a exposição e ajudam a situar o visitante, com um mapa explicativo. Todo esse movimento contribui para preencher o amplo espaço, por onde circulam idosos, crianças, gente de todas as idades e classes sociais, além de patos e gansos. Muitos patos e gansos, para a alegria da garotada. Programa especial e inusitado, sobretudo para quem não sabe o que vai encontrar ali, como foi o meu caso.
E, como se não bastasse, um anônimo, que devia ter os seus 70 anos, ou mais, toca flauta sentado num banco do jardim. Repertório que passeia dos Beatles à MPM, como se amanhã não houvesse.

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